Sociedades com desigualdades gritantes têm democracia ameaçada

Fernando Abreu*

«As próximas Comorações do 25 de Abril e do 1º.de Maio são dois momentos em que todos os Organizadores e Participantes deverão proclamar bem alto as exigências da Revolução inacabada e, em muitos aspetos sabotada.

Nas sociedades com desigualdades sociais gritantes, a Democracia tem o futuro ameaçado pelo crescente avanço do populismo.Perante esta real ameaça, os governantes continuam a tomar medidas que mais servem os interesses dos mais ricos e das grandes empresas do que a luta contra a degradação da situação económica e  social dos mais desfavorecidos, situação profundamente  agudizada pela pandemia.

Os dirigentes políticos, muitas vezes condicionados pelas instâncias internacionais, com destaque para o FMI, Banco Mundial e a própria Comissão Europeia, perderam o controlo da economia e estão subjugados pelos interesses do grande capital nacional e internacional.

Urge, pois, que os responsáveis políticos assumam a tomada de medidas agressivas tendentes a estabelecer urgentemente (e não para as calendas) no sentido de uma justa distribuição da riqueza em favor dos perdedores de sempre, os pobres, e também da classe média baixa, também ela, nos tempos mais recentes, atingida pela degradação do seu nível de vida.

Estudo recente da Fundação Manuel dos Santos, revela que, em Portugal, 1,700 mlhões de cidadãos, isto é, 1 quinto da população portuguesa vive, (e morre) na situação de pobreza.

Estes 1,7000 milhões de compatriotas nossos, segundo números do Banco de Portugal, sobrevive com o,1 por cento da riqueza produzida enquanto os ricos absorvem 70 por cento.

Quase 33% dos trabalhadores portugueses são pobres

Dos mil e setecentos milhões reconhecidamente pobres, 32,9 por cento são trabalhadores, 27,5 por cento Reformados, Precários são 26,6 por cento e desempregados 13 por cento.

Não estamos a falar de úmeros. Trata-se de pessoas vivendo em miséria imerecida, e tenhamos presente, que tais números são anteriores ao agravamento gerado pela pandemia pelo que a situação de pobreza em Portugal é, certamente, bem mais grave, já que, segundo especialistas, os critérios adotados para a definição de pobreza pecam falta de rigor científico, tanto mais que, em 2014, pessoa que tivesse um rendimento a mais de 1 Euro do que os € 422 €/ deixava de integrar a estatística).

Não se pense, porém, que a pobreza, à escala europeia, é um exclusivo português, posto que, segundo estatísticas oficiais, no conjunto dos 27 países da União Europeia, há 91 milhões de pobres o que corresponde a 21 por cento da população, acrescendo que existem mais 2,4 milhões de pessoas em risco de pobreza, o que aumenta a percentagem para 23,3 por cento.

Utilizando um dito brasileiro, “a justiça é como as cobras só morde os descalços”.

A pobreza, há que afirmá-lo, não é um fenómeno natural, é um fenómeno gerado com a cumplicidade de governos e de instâncias internacionais.

Não estamos todos no mesmo barco

A muito ouvida “conversa fiada” de que, devido à pandemia, “estamos todos no mesmo barco” é desmentida, dia após dia, mês após mês, ao tomar-se conhecimento do aumento escandaloso dos lucros e dos rendimentos dos milionários e bilionários por todo o mundo e da estagnação e redução salarial à escala global, e, obviamente, em Portugal.

A tútulo exemplificativo, uma das importantes e lucrativas empresas portuguesas, a EDP, vai distribuir pelos acionistas, nada mais, nada menos, que 750 milhões de Euros e, para os seus trabalhadores, propõem o,2 por cento de aumento. Na Bélgica, é o governamental, Conselho Central da Economia que limita os aumentos salariais a 0,4 por cento entre 2021 e 2023, ao mesmo tempo a empresas lucrativas concede generosos apoios. Nos Estados Unidos, o conhecido dono da Amazon que, com a pandemia, em 4 meses, enriqueceu 24 biliões de dólares, recusa-se a pagar um salário mínimo/por hora aos trabalhadores.

Os aumentos salários não só são um ato de justiça para com todos aqueles que no decurso da presente pandemia asseguraram, tantas vezes, com sacrifício generoso da sua vida e seus familiares, o funcionamento das empresas e os serviços prestados à comunidade, como também um meio direto de contribuir para a recuperação da economia, já que esse pouco dinheiro dos aumentos não vai ser amealhado mas consumido, enquanto que os lucros distribuídos a ricos e endinheirados não serão aplicados de forma reprodutiva, razão pela qual se justificava que os governos aumentassem os impostos sobre os lucros de tais empresas.

O Papa Francisco não se cansa de denunciar que esta “economia mata” e fá-lo não no sentido figurativo mas real.

Imposto sobre a riqueza

Até o FMI  (pasme-se) está a sugerir a aplicação de impostos de carater excecional sobre aas riquezas e as heranças, sugestão que (para maior espanto) estás a ser exposta de viva voz e no “site” do FMI pelo ex-ministro das Finanças PSD/CDS, Vitor Gaspar, o mesmo (recordam-se) que, na anterior crise, submeteu os portugueses à dolorosa austeridade.

Verdadeiramente esclarecedor sobre as consequências do desgoverno a que a “rédea salto” do capitalismo está a provocar por todo o mundo, e até nos Estados Unidos, é o Relatório, intitulado “Pentagon Report Points to Two Major Risks to National Security ” elaborado pelo Pentágono -Departamento de Defesa Americano, de 25 de Janeiro de 2021 (1), denunciador do “ apetite insaciável de Wall Street” (o mesmo é dizer dos milionários e bilionários) pelos lucros rápidos em detrimento dos investimentos a longo termo, a investigação e o desenvolvimento. Um alerta que pode e deve ser tomado em consideração por quem vai gerir a “bazuca” em Portugal.

Há que exigir, LUTAR, para que o governo português não satisfaça os interesses insaciáveis dos “donos de tudo isto” que se preparam para sacar a “parte de leão” e, corajosamente, assuma os riscos de combater os poderosos no respeito dos Direitos Humanos dos mais desfavorecidos.

As próximas Comorações do 25 de Abril e do 1º.de Maio são dois momentos em que todos os Organizadores e Participantes deverão proclamar bem alto as exigências da Revolução inacabada e, em muitos aspetos sabotada.

Lisboa, 15 de Abril de 2021.

 

*Fernando Abreu foi fundador e coordenador nacional da BASE-FUT, sindicalista e trabalhador do sector automóvel.

 

(1) Breve transcrição traduzida de Artigo publicado no diário Belga “Le Soir” em 9 de Fevereiro de  2021.

 

 

 

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