Em 2009 morreram nas estradas da União Europeia 35 mil pessoas e um milhão e meio sofreu ferimentos, com um sofrimento incomensurável e mais de 130 mil milhões de euros de custos.Muitas destas pessoas morreram a trabalhar, nomeadamente muitos motoristas de mercadorias.
Portugal Continental tinha quase 80 mil pessoas a trabalhar nos transportes em 2012 sendo que mais de 50 mil seriam dos transportes de mercadorias.Em Portugal cerca de 30% dos acidentes de trabalho mortais ocorrem no trabalho de transporte rodoviário.
Um parte susbstancial dos motoristas ou camionistas, como dizemos frequentemente, trabalham para pequenas empresas ou como independentes.Todavia, trabalham com regras e num quadro legal europeu e nacional, nomeadamente no quadro da Directiva 2002/15/CE relativa à organização do tempo de trabalho das pessoas que exercem actividades móveis de transporte rodoviário e a Lei nº27/2010 de 30/08 relativa aos tempos de condução, pausas, repouso e tacógrafos.Ainda existem regulamentos comunitários e outra legislação que enquadra esta actividade que, sob ponto de vista laboral, está sob a fiscalização da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) mas também sob a alçada de outras autoridades como a PSP e GNR.
As condições de trabalho motivaram campanha da inspeção do trabalho
Preocupada com as condições de trabalho, em especial com as condições de segurança e saúde aquela Autoridade desenvolveu em 2015/16 uma camapanha de informação, formação e inspeção dirigida ás empresas do sector.Os objectivos a alcançar eram importantes ,com destaque para a necessidade de cumprir os tempos de repouso, horários e informar sobre os riscos ergonómicos e psicossociais, para além da prevenção de outros factores como o alcoolismo e as drogas.
Vários testemunhos, inquéritos e estudos relatam as condições de trabalho destes profissionais destacando- se a fadiga crónica que pode, com o decorrer do tempo levar a outras doenças do foro físico e psicológico, o stresse, as noites mal dormidas e o ruído.Apesar da melhoria considerável sob ponto de vista ergonómico da generalidade dos veículos os camionistas continuam a ter graves problemas do domínio músculo-esquelético pois estão sujeitos às vibrações e carga física em particular na coluna.
O documento base da Campanha da ACT referia a alta sinistralidade no trabalho que afecta os motoristas e a dado passo salientava:« Quando comparados com outros grupos ocupacionais, os motoristas apresentam elevado absentismo e incapacidades várias para o trabalho, tanto a nível psicológico (fadiga, tensão e sobrecarga mental, perturbações do sono, etc.), como perturbações músculo-esqueléticas (costas, joelhos, pescoço e ombros). »
Além disso, refere ainda o documento «a pressão/gestão do tempo atribuído para a execução das tarefas/atividades pode provocar stresse relacionado com o trabalho, maus hábitos alimentares, perturbações do sono, pausas inadequadas e descanso insuficiente. Os longos períodos de trabalho com horários de trabalho irregulares, a solidão, falta de envolvimento, agressão do público/clientes, de colegas de trabalho, de outos condutores ou utilizadores da via pública e/ou a separação da família e dos amigos, são outros aspetos relevantes e potenciadores de riscos psicossociais.
O factor tempo é determinante nas condições de trabalho
Referindo a importância dos horários continua aquele documento:«No contexto do transporte rodoviário, a pressão do tempo é um grande fator gerador de stresse. Assim, no transporte de passageiros (particularmente em meio urbano ou suburbano) o volume de tráfego e o movimento de passageiros dificultam o cumprimento de horários, aumentando a complexidade da tarefa; no transporte de mercadorias, as pressões de tempo impostas muitas vezes por razões económicas são igualmente também geradoras de stresse. Em qualquer dos contextos (passageiros ou mercadorias), as condições organizacionais de trabalho devem assegurar que o trabalhador tenha acesso às indispensáveis condições de repouso e recuperação funcional».
São assim necessárias medidas de prevenção e melhoria das condições de trabalho afirmando o documento da ACT como conclusão :« Coloca-se assim em destaque, a necessidade das empresas melhorarem capacidades de gestão, aí integrando a prevenção dos riscos profissionais como forma de reunir, organizar e rentabilizar um conjunto de meios e de processos suficientes e adequados à promoção de níveis, cada vez mais elevados, de segurança, saúde e bem-estar. Neste modelo de gestão, a participação dos trabalhadores, enquanto atores da prevenção, assume uma dimensão essencial, não só quanto ao envolvimento nos domínios da informação e da formação, mas fundamentalmente no campo da consulta e da cooperação nas atividades da prevenção.»
Estas perspectivas são igualmente apoiadas pela Organização Internacional do Trabalho e a nível europeu pela Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho em vários documentos.
A FECTRANS, a Federação sindical do sector e que participou nesta Campanha, é uma das organizações sindicais que mais tem investido na promoção da segurança e saúde dos trabalhadores dos transportes.Na discussão sobre a actualização do novo contrato colectivo esta organização sindical negoceia questões não apenas salariais mas também de condições de trabalho como horários de trabalho, exames médicos, compensações várias e descanso.
A luta dos motoristas por melhores condições de trabalho é justa
Sabemos que estes profissionais conseguem criar um conjunto de estratégias defensivas para ultrapassarem da melhor maneira os problemas da profissão nomeadamente a solidão e a distância da família.Por isso se tornaram famosos alguns programas de rádio nocturnos onde os camionistas podem falar para outros camionistas e para quem trabalha também de noite.Por outro lado conseguem criar estratégias de grupo e de encontro para falarem e se entreajudarem.São em geral solidários uns com os outros pois em caso de problemas é com os seus camaradas que vão contar.
Os camionistas transportam coisas diferentes o que obriga a diferenciação também nos horários, riscos e até nas remunerações.O caso agora mais mediático e conflitual são os motoristas de mercadorias perigosas .São motoristas com formação específica e certificação especial.Podem transportar materiais químicos e produtos poderosamente inflamáveis como a gasolina e até materiais radioactivos.
A luta por melhores condições de trabalho dos motoristas de mercadorias é uma luta justa.Exige-se uma valorização salarial destas pessoas e um estatuto que não permita esquemas dúbios de remuneração que prejudicam claramente o fisco e a segurança social.Exige-se um forte reforço da Autoridade para as Condições do Trabalho para que esta entidade possa actuar mais vezes nas estrada e nas empresas.Segundo o sindicato dos inspectores do trabalho afirmava em recente comunicado a ACT tem falta de inspectores e ainda trabalha com métodos muito burocráticos e pouco flexíveis.
Espera-se que o actual conflito que opõe alguns motoristas aos patrões da ANTRAM conduza ao necessário diálogo e resolução dos problemas da classe.