Brandão Guedes
De vez em quando os sindicatos da PSP e da GNR fazem ouvir a sua voz na rua.Ontem,dia 21 de novembro, mais uma vez aconteceu em Lisboa,junto à Assembleia da República uma grande manifestação de agentes policiais e militares da GNR.Nota-se nestas forças há muitos anos um mal estar que já não está circunscrito aos próprios e respectivos familiares mas que já se expandiu para outros sectores da sociedade com repercussões políticas óbvias.Este mal estar tem a ver com as condições de trabalho destes profissionais,com o seu reconhecimento,imagem e papel na sociedade democrática.
Se verificarmos as reivindicações sindicais dos polícias e guardas chegamos à conclusão que são negociáveis e, na sua maioria justas.Para além dos 978 euros brutos que pretendem no início da carreira e reforma aos 55 anos ou 36 de serviço os sindicalistas debateram com o ministro a 15 deste mês outras importantes reivindicações como a aplicação da legislação sobre a prevenção e promoção da segurança e saúde no trabalho , actualização dos suplementos remuneratórios e ajustamentos nas carreiras.
Segundo comunicado sindical mais uma vez o Ministro informou que as matérias« estão pendentes para resolução,para isso haverá uma calendarização a médio prazo para discutir com o Secretário de Estado».Como dizia um manifestante à televisão:«às nossas reivindicações de muitos anos respondem-nos com comissões e reuniões».
É verdade que os sindicatos estarão disponíveis para um debate que seja para resolver os problemas e não para protelar os mesmos indefinidamente. Naturalmente que algumas reivindicações terão que ser ponderadas, não no sentido de perderem direitos mas de consolidarem os mesmos.Por exemplo a reivindicação justa de implementação de condições de segurança e saúde em todos os locais de trabalho, nomeadamente esquadras com alojamentos dignos e equipamentos de trabalho modernos e adequados,avaliação de riscos, nomeadamente psicossociais e exames médicos.
Esta justa reivindicação, transversal a quase toda a Função Pública apesar de reforço legislativo recente, não se coaduna muito bem com um subsídio de risco.A profissão de polícia tem riscos.Mas existem outras profissões com grandes riscos.Quem vai para polícia sabe que é uma actividade de risco e para isso tem preparação específica.A reivindicação de subsídio de risco deve ser incorporada no salário em todas as profissões e deve ser substituída pela reivindicação de prevenção dos riscos e promoção da segurança e saúde no trabalho.
Quanto à reivindicação da reforma também deve ser ponderada pois mesmo tendo em conta as condições específicas da profissão creio que poderia passar para os 60 anos.Encarar a profissão de polícia, de todos os policias como tropa de choque é um erro.É evidente que a polícia pode ter missões que não serão adequadas para homens que já tenham mais de 55 anos.Mas a polícia é uma força de segurança com múltiplas missões, nomeadamente de informação, de vigilância de rotina, de escolas, de eventos, de escritório etc.Por acaso essas actividades não podem ser desenvolvidas por homens e mulheres com 55 e mais anos?
As reivindicações centrais são, portanto, a de remunerações justas,condições de trabalho adequadas, nomeadamente ao nível de armas,viaturas, comunicações e protecção ,vigilância da saúde física e psíquica,abertura de concursos para contratação de mais profissionais.A questão do estatuto e das carreiras é igualmente importante no sentido de dignificar e motivar os agentes.
Depois temos o importante problema dos poderes policiais que passa pelo estatuto, direitos e deveres dos agentes.Os agentes têm que se sentir protegidos pela lei e não podem estar com medo de que poderão ser castigados ou atacados com toda a facilidade.Todavia, se eles devem estar protegidos pela lei os outros cidadãos também estão protegidos pela mesma e não podem estar sujeitos à violência policial discricionária.
Mas é neste terreno que se joga a questão política mais importante.A população está mais disponível para se colocar ao lado da polícia,mesmo quando esta abusa, do que ao lado de uma eventual vitima da mesma.Esta percepção tem a ver com a nossa cultura tradicional sobre a autoridade e com o sentimento de segurança das populações.Mas é aqui que as forças autoritárias e neo -nazis estão actuando,procurando não apenas infiltrar as forças de segurança , assumindo as suas reivindicações, como explorando os sentimentos de medo e insegurança das populações.Neste sentido a manifestação do passado 21 de novembro é um alerta.O governo deve ter consciência que, no limite, a austeridade pode destruir os serviços públicos, nomeadamente as forças de segurança.Mas o alerta é também para as múltiplas organizações sindicais do sector que terão que ser mais eficazes.Um novo actor não sindical entrou em cena para lhes disputar o terreno.
*Dirigente da BASE- FUT