A BASE-FUT reuniu em Lisboa a Direção Nacional no passado sábado, dia 29 de junho, para análise da situação social,política e sindical,para além de avaliação à sua atividade semestral.Algumas das preocupações foram o crescimento da extrema direita e a situação no Movimento Sindical, com destaque para a tensão/conflito que existe neste momento no interior da CGTP. António Brandão Guedes esclarece algumas das questões que preocupam a BASE-FUT.
1.O tempo político está difícil e complexo nomeadamente para as organizações de trabalhadores.Como encara a BASE-FUT a situação actual do crescimento da extrema direita?
A BASE-FUT na sua última reunião de finais de junho fez uma análise mais detalhada da situação e não podemos deixar de estar preocupados com o crescimento da extrema direita em Portugal e noutros países da UE.
Em comunicado recente de análise aos resultados eleitorais salientamos que se não forem implementadas medidas sociais e económicas que vão ao encontro dos cidadãos a situação pode ainda piorar.
A subida da extrema direita na Europa e noutras latitudes é fruto de várias dinâmicas sociais e económicas ocorridas nas últimas décadas com destaque para as políticas neoliberais que os partidos da direita e da social democracia assumiram.Políticas de austeridade,de contenção salarial e de inflação.Existem camadas importantes de cidadãos, nomeadamente de trabalhadores,que estão a empobrecer,não conseguem rendimentos suficientes para pagar as rendas ou mensalidades da habitação,não conseguem alimentar-se condignamente e não conseguem suportar os gastos com a educação.
Por outro lado, os interesses económicos e financeiros, os chamados investidores,que hoje quase não têm rosto,exigem mais ganhos e com maior rapidez,obrigam as empresas a uma maior competição e intensificação do trabalho.Compram cadeias de televisão,montam uma máquina de propaganda de velhas ideias,propagam uma cultura de hiper consumo e hiperindividualismo,desacreditando as opções do bem comum,da ação coletiva do comunitário.
2.Perante esta situação não se torna preocupante que o Movimento Sindical esteja com dificuldades de agir e perdendo associados?
Considero a situação muito preocupante de facto.Olhamos para a Confederação Europeia de Sindicatos e nunca esteve tão paralizada na sua ação.A estrutura funciona,os seus dirigentes vão a Bruxelas,fazem-se estudos e resoluções ,mas tudo muito mansinho,como de um departamento se tratasse!A dinâmica de base confedetal está pouco ativa e em muitos locais de trabalho da UE,mais de metade, não existe organização sindical.
Olhamos para os diferentes países e a situação é semelhante com mais uma ou outra manifestação ou greve mais prolongada.No nosso País temos uma UGT esperando as reuniões da concertação social e uma ou outra negociação de um acordo para aparecer.A CGTP, a unica que ainda mexe em algumas empresas e mobiliza algumas camadas de trabalhadores, está com um conflito interno de difícil resolução.
3.O que se passa no interior da CGTP com a corrente socialista a contestar publicamente as práticas sindicais dos sindicalistas do PCP não é uma questão recente.
Não é recente de facto,mas agravou-se no último Congresso com a ausência dos sindicalistas socialistas da Comissão Executiva da Central porque pretendiam alargar a sua representatividade e incluir naquele órgão elementos do Bloco de Esquerda.A maioria afeta ao PCP tem sido irredutível.
Esta situação é preocupante numa altura em que estão em ascensão as forças de extrema direita.Na minha opinião os atuais dirigentes da CGTP afectos ao PCP estão menos interessados em promover a unidade entre as diferentes sensibilidades politico-sindicais que estão na origem histórica da Intersindical.Na nossa opinião terá que haver mais diálogo e confiança mútua, evitando a todo o custo as lutas partidárias no Movimento Sindical.
Para a BASE-FUT os sindicalistas antes de serem miltantes partidários devem ser sindicalistas.Um sindicalista é capaz inclusive de ser crítico frente a políticas do seu próprio partido.Nós defendemos a autonomia sindical e nehum dirigente político nos vem dizer como temos que atuar neste ou naquele contexto.
A CGTP é acusada de ter um discurso e uma prática sindical muito próxima do PCP.Esta situação pode ser confortável e até estimulante, para os militantes comunistas.No entanto, esta situação não beneficia o alargamento da base sindical, social e política da CGTP que está diminuindo.Os sindicalistas do PCP terão que decidir, se ainda não decidiram,se querem uma central unitária ou uma central de um partido político.Ambas as opções são legítimas.As correntes minoritárias, incluindo a BASE-FUT,terão que fazer pela vida se, porventura, querem ter alguma influência no mundo do trabalho.
4.E o que pode fazer a BASE-FUT perante esta situação?
Podemos fazer muito pouco dado que não temos os meios necessários para dar a necessária sustentabilidade à nossa Organização.Não somos um sindicato nem um partido político e como tal não temos verbas oficiais,com excepção de um ou outro projeto apoiado pela Comissão Europeia através da rede EZA.A BASE-FUT vive sustentada pelo trabalho dos seus militantes , nem um um dirigente tem a tempo inteiro.Quando dizemos isto no estrangeiro as pessoas ficam de boca aberta perante o trabalho que ainda fazemos!
O nosso principal papel continua a ser o de formar, informar e alertar para a necessidade dos trabalhadores se auto-organizarem livremente caso queiram ter algum poder nesta sociedade.As lamentações e críticas ao que se passa no Movimento sindical são necessárias e compreensíveis mas não vão ajudar muito num mundo onde impera antes de mais a relação de forças.
5.O campo cristão,mais propriamente católico gerou no passado um bom número de sindicalistas que tiveram um papel importante tanto na CGTP como na UGT.Hoje parece que este campo abandonou os sindicatos.
Em Portugal os sindicalistas que se formaram na JOC,LOC e BASE-FUT tiveram, e ainda hoje têm, alguma participação no mundo do trabalho e em particular nos sindicatos.Todavia, constatamos que se deu um envelhecimento dos quadros sindicais oriundos dessa área cultural sem a necessária substituição por gente nova.Por outro lado,os Movimentos da Ação Católica Operária,nascida na década de 30 do seculo XX, e que fazem um trabalho social e laboral meritório, não têm um apoio mínimo e exigível da estrutura da Igreja Católica em particular do Episcopado.
A Igreja portuguesa nunca teve uma «Pastoral Operária» digna desse nome,ou seja,nunca teve um desígnio progressista no quadro da «doutrina social da Igreja»,com apoios humanos e financeiros a esses Movimentos.Os responsáveis da Igreja preferem apostar mais no culto e em ações de massas como as Jornadas da Juventude por mais efémeras que sejam.
Se analisarmos a história do catolicismo social português vemos um labor imenso de militantes, padres e leigos, que deram muito da sua vida ao mundo do trabalho e nunca foram devidamente reconhecidos.Por vezes até foram olhados de lado, com desconfiança.
Há hoje muita gente, não necessáriamente cristã, que se interroga sobre esta questão.Porque será que o mundo do trabalho, tão importante na vida das pessoas,é tão lateral nas preocupações do Episcopado e de outros responsáveis da Igreja Católica?
Nós, BASE-FUT,pensamos que era muito importante que a Igreja Católica investisse muito mais na transformação humanista das relações de trabalho, no Trabalho digno!Há trafico clandestino e exploração de trabalhadores imigrantes,nomeadamente na agricultura e na construção;salários longe do montante necessário para uma vida digna pessoal e familiar;assédio moral e sexual,esgotamento profissional, acidentes de trabalho e doença profissional!…Enfim, pessoas e famílias destruídas! É a economia que mata diz Francisco!Pelo que vimos nos debates e conclusões do Sínodo esta realidade não esteve presente!Como é possível?