Em entrevista cedida inicialmente ao «Jornal de Sintra», e publicada aqui com a sua autorização ,Fernando Abreu escreve sobre as perspectivas do sindicalismo, agora com algum recuo pois deixou há muito as lides sindicais e de coordenador da BASE-FUT.Não deixou, porém de acompanhar as lutas dos trabalhadores e os desafios que o sindicalismo enfrenta nos dias e hoje.
Redação:Como interpreta o sindicalismo de hoje
Fernando Abreu-Internacionalmente é reconhecida, por sindicalistas e investigadores sociais, que o sindicalismo atravessa, desde há anos, uma fase de acentuada crise não tanto no que respeita à sua tradicional missão histórica como, sobretudo, na dificuldade que tem demonstrado em fazer frente às mutações ocorridas na sociedade.
Há que reconhecer que, para além das medidas de repressão da actividade sindical tomadas nos anos 80 do século passado pela maioria dos governos de inspiração neo-liberal que submeteram os sindicatos a uma luta desigual que os conduziu a refugiarem-se numa acção defensiva de defesa dos direitos alcançados
Opção esta que conjuntamente com a incapacidade revelada de, atempadamente, compreenderem as consequências da Revolução Tecnológica, teve como consequência que, ao invés, de como seria desejável, em vez de o trabalho humano ser aliviado pela redução de horários e de melhorias salariais, proporcionadoras de um Viver Melhor, serviu ao patronato para aumentar o desemprego, desqualificar funções e criar uma legião de novos explorados e escravos: os precarizados.
Redação-Como alargar horizontes, do que abdicar ou não, o que corrigir?
Fernando Abreu-O Sindicalismo na sua já longa história passou por várias crises, e sempre encontrou novos caminhos
É, pois, expectável que também sairá da actual crise renovado e reforçado na sua capacidade de mobilização e acção, o que já começa a verificar-se em alguns países, e em todos os continentes, em resultado das mudanças a nível da filosofia e da organização procurando adaptálas ás novas realidades da organização do trabalho e da sociedade.
Para esta minha positiva dedução contribui o facto de, actualmente, em muitos países, salvo nos países em que os sindicatos estão sujeitos a controlo estatal, ocorrer uma tomada de consciência por parte dos dirigentes sindicais de que, para as novas situações e exigências é exigida uma Renovação Ideológica, de Objectivos e de Organização, não podendo o Sindicalismo limitar-se à defesa dos trabalhadores com trabalho e sindicalizados.
Das análises feitas às razões da crise destaca-se a de que a descredibilização dos sindicatos foi a de ter descurado a acção e organização dos trabalhadores das novas profissões, dos desempregados, dos precarizados e dos jovens, prática que configurou um tipo de corporativismo sindical em que esteve ausente a Solidariedade – sinal fundador e distintivo do sindicalismo.
Para o desinteresse pela participação sindical contribuiu a burocratização e o cupulismo que se instaurou em elevado número de sindicatos, e que presentemente está a ser superado através do reforço do contacto directo com os trabalhadores à saída das empresas, bem como de iniciativas culturais tentando proporcionar espaços e actividades em que os sindicalizados e trabalhadores interessados participem em Encontros de Debate sobre a Acção Sindical, a luta contra a ideologia do trabalho e pela reorganização do trabalho em moldes que permitam uma vida profissional, familiar e cívica respeitadora da sua dignidade humana, experimentações estas que , em muitos países, estão a ser desenvolvidas com o apoio de Investigadores Universitários.
É de destacar que da análise à situação de crise resulta a conclusão de que uma das medidas consideradas como da maior importância para a revitalização do sindicalismo reside no seu regresso às Origens.
Efectivamente, os sindicatos nasceram como movimento de trabalhadores que se organizavam nos seus locais de trabalho ou de residência para lutarem por redução da carga horária, de melhorias salariais, sanitárias, e era neles que residia a força mobilizadora.
Porque o Sindicato não é uma associação mutualista que recebe cotas e, em troca, presta serviços.
Os sindicatos são um Movimento e a força do movimento reside na capacidade de acção dos trabalhadores para a imposição dos direitos, interesses e anseios, individuais e colectivos da classe.
Outra das perspectivas que está, digamos, na ordem do dia, é a de que, tendo em vista a sua imperativa necessidade de Renovação, o Sindicalismo deve considerar-se como um Movimento entre outros Movimentos, pelo que não obstante a sua implantação, organização e historial seja ímpar, devem os seus dirigentes ter a humildade de se empenharem em convergir na acção com os Movimentos progressistas de carácter ecológico, educativo, consumo, urbanismo, jovens e femininistas, para acções comuns com o Objectivo de, em conjunto, obterem conquistas civilizacionais e avanços na construção da democracia participativa.
Redação-Que expectativas quanto à evolução do sindicalismo em Portugal
Fernando Abreu-Não existem que eu saiba estudos e análises quanto ao que os trabalhadores, e a sociedade em geral, pensa sobre o estado do sindicalismo em Portugal, e esta é uma questão sobre a qual as Centrais Sindicais não dão quaisquer sinais para o exterior.
Obviamente, que se a nível internacional há problemas, é evidente que também em Portugal eles existem, pelo que “grosso modo” se poderá afirmar que os problemas com que o Sindicalismo se confronta a nível de praticamente todas as Confederações existentes mundialmente, também, em maior ou menor escala, se colocam também às Centrais Sindicais portuguesas.
Embora o Estudo que vou citar fosse dirigido ao tema : “O Futuro do Trabalho entre as Vozes da Academia e as Perspectivas Sindicais” (Hermes Augusto Costa-CES – Coimbra), nele são revelados.pelos representantes sindicais entrevistados. alguns dos problemas, que, embora de ordem bastante diversa dos por mim abordados anteriormente, destaco, os que me ocorrem: o excesso de homens, em desfavor das mulheres, nos órgãos de cúpula dos sindicatos, a proximidade e a dependência dos dirigentes sindicais face aos partidos políticos, divisões ideológicas e a taxa de sindicalização bastante baixa.
Esta última é uma realidade preocupante porquanto há 3 anos, segundo estudo da OIT a taxa de sindicalização estava nos 16 por cento, o que correspondia a uma quebra da ordem dos 34 por cento, por comparação com a taxa verificada em 1974 que era da ordem dos 50 por cento.
Desconhecem-se as razões objectivas de tal situação, dado não haver estudos sobre o assunto, o qual nos revelaria certamente as razões das desfiliações e do que consta ser o baixo número de filiações.E, este não é um problema menor.
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