Novos caminhos para a Igreja Católica?

com Sem comentários

 

Fátima Almeida*

Sínodo para a Amazónia -a evangelização que emerge da vida ,da cultura e da ecologia

Com o tema “Amazónia, novos caminhos para a Igreja e para a ecologia integral” o Papa Francisco convocou, em outubro de 2017, o Sínodo para a Amazónia. Este Sínodo, que se realiza entre os dias 6 e 27 de outubro, próximo, no Vaticano, foi apresentado como mais um  meio de fortalecer e incentivar a Igreja a uma evangelização com “rosto amazónico”. A Encíclica Laudato Si tem sido um instrumento relevante na preparação e reflexão que está a ser feita em todas as comunidades locais, dos nove países com floresta amazónica, (a), envolvendo ativamente leigos, padres e bispos das regiões.

O Papa Francisco desejava que os novos caminhos de evangelização fossem pensados “para e com o povo de Deus” que habita nessas regiões. Que, na sua preparação, deveria integrar habitantes de zonas rurais, de cidades e grandes metrópoles, migrantes e deslocados, especialmente para e com os povos indígenas.

O Sínodo para a Amazónia, é também um meio de sensibilizar e desafiar a igreja universal, todos os crentes e não crentes, para a necessidade de mudanças profundas nos estilos de vida que se vivem atualmente, onde persistem economias predadoras, que provocam tanta desumanidade, que excluem milhões de pessoas de viver com dignidade e matam sem dó nem piedade. Que podemos aprender, com os povos indígenas, que se pode viver com “sobriedade e ser feliz” e que se pode “viver em convivência com a terra” e com os seus recursos naturais, “sem os destruir”.

Em 2018, no encontro que teve com os povos indígenas, em Puerto Maldonado, no Peru, a propósito deste Sínodo, o Papa Francisco denunciava e anunciava: “Provavelmente, nunca os povos originários amazónicos estiveram tão ameaçados nos seus territórios como o estão agora. A Amazónia é uma terra disputada em várias frentes: por um lado, a nova ideologia extrativa e a forte pressão de grandes interesses económicos cuja avidez se centra no petróleo, gás, madeira, ouro e monoculturas agroindustriais; por outro, a ameaça contra os vossos territórios vem da perversão de certas políticas que promovem a «conservação» da natureza sem ter em conta o ser humano, nomeadamente vós irmãos amazónicos que a habitais.”…(b)

“Em contrapartida, é justo reconhecer a existência de esperançosas iniciativas que surgem das vossas próprias realidades locais e das vossas organizações, procurando fazer com que os próprios povos originários e as comunidades sejam os guardiões das florestas e que os recursos produzidos pela sua conservação revertam em benefício das vossas famílias, na melhoria das vossas condições de vida, da saúde e da instrução das vossas comunidades. Este «bom agir» está em sintonia com as práticas do «bom viver», que descobrimos na sabedoria dos nossos povos. Seja-me permitido dizer que se, para alguns, sois considerados um obstáculo ou um «estorvo», a verdade é que vós, com a vossa vida, sois um grito lançado à consciência dum estilo de vida que não consegue medir os custos do mesmo. Vós sois memória viva da missão que Deus nos confiou a todos: cuidar da Casa Comum.”(b)

A Igreja na Amazónia

A Igreja nas regiões da Amazónia é caraterizada pela vivência comunitária e promotora da colaboração entre todos os membros, padres, congregações religiosas, associações e movimentos, leigos e leigas. Todas e todos são chamados para a responsabilidade de animar e de evangelizar. E evangelizar significa lutar pela defesa e proteção da vida humana, da terra e dos seus recursos naturais que são a base de sustentabilidade destes povos.

A premência deste Sínodo, é também reveladora da situação dramática em que vivem, atualmente, estas comunidades. São mais de 30 milhões de pessoas  ameaçadas pela destruição das suas terras, pela poluição, pelas mudanças climáticas e, que se sentem, constantemente, desprotegidos e violados, nos seus Direitos Humanos Universais.

O Sínodo tem o dom de sensibilizar e desafiar a Igreja Universal, todos os crentes e não crentes, a deixarem-se interpelar pela maneira como vivem estes povos, na fraternidade, na entreajuda, na solidariedade e na sobriedade. E, principalmente, como vivem estes valores no respeito pelo meio ambiente, pela terra a que chamam mãe, pelos recursos que dela brotam, que consideram que são de todos e que por todos devem ser distribuídos. Este Sínodo e toda a sua preparação é uma oportunidade de partilha e de aprendizagem dos valores e da vivencia evangélica a partir das Bem Aventuranças e da convivência com a natureza, sem a destruir, e que representa a tão almejada “ecologia integral” proposta pelo Papa Francisco na Laudato Si. Todas e todos são chamados a experimentar o “bom viver” e o “bom agir”.

O processo de preparação/caminho sinodal tem sido de muita escuta e partilha sobre o processo de desenvolvimento, que tantas vezes ignora a presença e cultura histórica das populações locais e das comunidades tradicionais, a realidade das migrações e o modo de viver nas regiões amazónicas. Destaca-se ainda nesta escuta e partilha o reconhecimento do papel dos leigos, e principalmente das mulheres na animação e organização de grupos e de comunidades pastorais.

Realçar o papel das mulheres e opção pelos pobres

Porque não se pode falar dos movimentos sociais e de promoção humana na Amazónia sem realçar a intervenção das mulheres e o seu compromisso na dinamização do ensino escolar e da alfabetização, da educação para a prevenção e cuidados da saúde e  da defesa da dignidade e da igualdade de oportunidades das pessoas destas regiões. O Sínodo, ao reconhecer o papel das mulheres na Igreja da Amazónia, faz também justiça a todas as mulheres que foram mortas na defesa dos direitos e da vida dos povos destas regiões, entre elas, algumas religiosas, que escolheram estas comunidades e este modo de viver para realizar a sua missão evangelizadora.

Este Sínodo tem uma dimensão de escuta, de gratidão e de estimulo às comunidades cristãs Amazónicas, mas é também um chamamento e uma interpelação à nossa consciência humana, fraterna e desprendida, apelando ao discernimento de novas vivências, de novos estilos de vida tendo como referência o “Bom Viver” destas comunidades e as propostas da Laudato Si.

Por isso, todas as comunidades cristãs, devem sentir-se interpelados a viver com maior radicalidade, a opção primordial pelos pobres, pelos que são descartados e excluídos, pelos que são vitimas das injustiças e perseguições, a serem pobres entre os pobres.

“Um membro sofre? Todos os outros membros sofrem com ele”, é o repto de S. Paulo, que  pode impulsionar o paradigma de mudança, nas nossas comunidades e sociedade. Deixarmos o individualismo e consumismo em que estamos imersos, e pensarmos mais no bem coletivo, na solidariedade e no “bem comum” da comunidade e de todos os povos. E que uns e outros somos chamados a “sermos a memória viva da missão que Deus nos confiou: cuidar da Casa Comum”, (b) que é de toda a humanidade e a todos deve servir integralmente.

*Fátima Almeida é Copresidente do Movimento Mundial dos Trabalhadores Crisãos (MMTC)

http://mmtc-infor.com/es/

 

_________________________________

 Notas: Para informação

(a) e (b) estão no texto

(c) – é o link para o documento preparatório deste Sínodo

(d) – Explicação do logo para o Sínodo

(e) – logo do Sínodo

 

 

 

Junta-te à BASE-FUT!