José Ricardo*
A propósito das últimas ações do movimento dos jovens “ocupas”, reivindicando a concretização das medidas de proteção do ambiente, que tardam em sair do papel dos Acordos e Protocolos assinados pelos governos, muitos analistas e comentadores liberais indignam-se da “monopolização da esquerda”, relativamente a esta bandeira de luta. Argumentam que o combate às alterações climáticas é consensual e ultrapassa a dicotomia esquerda-direita. Esta ideia foi defendida recentemente no programa do “Governo Sombra” e é acompanhada por muitos comentadores de direita.
Há uma ideia simples que estes comentadores tardam em perceber. A razão de ciência das alterações climáticas atingiu tamanho grau de profundidade que só os mais estúpidos como o Trump, Bolsonaro e seus seguidores é que se mantêm em negação. Portanto, mesmo os que gostariam que tudo ficasse como dantes, são forçados a aceitar o que é evidente.
A dificuldade está em que uma coisa é perceber o problema, mas outra coisa bem diferente é agir em conformidade, sobretudo quando esse agir implica alterar os modelos de desenvolvimento económico, não acautelar o retorno dos investimentos realizados e alterar os status de consumo.
Há uma razão poderosa para o insucesso de todos os Protocolos assinados e uma razão complementar para perceber porque razão a luta pela defesa da Natureza e do meio ambiente é uma luta socialista, de esquerda e revolucionária.
Está mais do que provado, por estudos de vários autores, que as alterações tecnológicas só acontecem muito depois de terem sido inventadas, não só para preservar a propriedade dos meios de produção existentes, mas, sobretudo, para possibilitar a gradual introdução das novas tecnologias, de modo que os proprietários dos meios de produção de antes sejam os donos dos meios de produção do futuro. Excetuam-se, talvez, as invenções mais disruptivas de alguns segmentos de produção e serviços que acrescentam inovação, mas não colocam em causa a sustentabilidade dos processos existentes no curto prazo.
A luta pela defesa do meio ambiente, sustentável e ecológico é uma luta de esquerda e socialista
A luta pela defesa do meio ambiente, sustentável e ecológico, é uma luta de esquerda e socialista porque ela obriga à morte da racionalidade do lucro, que é a mola impulsionadora do sistema capitalista, para dar vida a uma nova racionalidade de cooperação e partilha, de reaproveitamento sistemático do desperdício, sem a preocupação de produzir mais e mais para distribuir dividendos aos acionistas.
A manutenção da vida no Planeta Terra está dependente de modelos de desenvolvimento que substituam os sistemas capitalistas atuais. Essa transformação de modelos de produção estará imbrincada, obrigatoriamente, por novas formas de pensar, viver e relacionar entre as pessoas.
Não bastará substituir os carros a diesel por carros elétricos. Se as alterações se centrarem apenas nas emissões de gases de estufa, podemos acordar tarde, com partes do nosso corpo a produzir polímeros, a partir das partículas de plástico que vamos ingerindo com o peixe. E este tema só é risonho num romance de ficção científica.
20/11/2022
*Mestre em Ciências da Educação, Activista Social.