Pierre Marie*
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) contempla este ano o seu centenário. Criada após a Primeira Guerra Mundial em abril de 1919, a OIT tem por objetivo a defesa do trabalho decente e da justiça social. Com a fundação da Organização das Nações Unidas (ONU) em 1946, o OIT tornou-se a primeira agência especializada da ONU. A instituição viu a sua ação reconhecida ao ser galardoada com o Prêmio Nobel em 1969.
No último dia 11 de junho, as comemorações do centenário da OIT juntaram vários chefes de Estado na sede da organização em Genebra, na Suíça. Entre eles o Presidente da República Francesa, Emmanuel Macron. Mas mais surpreendente do que a presença do chefe de Estado francês, foram as palavras proferidas por este na tribuna da OIT.
Ao longo de cerca de 45 minutos, Emmanuel Macron denunciou as derivas de um capitalismo que, segundo as suas palavras, “se tornou louco”. “Esta economia de mercado na qual estamos a viver é muito menos social do que gostaríamos no final da Segunda Guerra Mundial. Isto está a levar a muito mais acúmulo de renda e a corporativismo”, referiu o Presidente francês.
Salientou que existe uma “crise profunda” alimentada pelo dumping social, a destruição do planeta e a injustiça social. Segundo Emmanuel Macron, “esta é uma crise que pode parecer menos grave porque as vítimas não têm tanta voz – elas estão espalhadas, não unidas – e ainda não vimos uma guerra a sair disto, mas a crise está lá”. Esta crise conduziria ao enfraquecimento da democracia. Os falhanços do capitalismo alimentam os extremos, o autoritarismo e colocam o mundo num risco de guerra. Em resposta, Macron apelou para a instituição de um salário mínimo europeu.
Só podemos concordar com este diagnóstico de um sistema que gera lucros e acumulação de riquezas para alguns e empobrecimento para a maioria. A loucura do capitalismo leva ao retrocesso civilizacional com a perda de direitos e uma crescente precariedade laboral. A loucura do capitalismo leva à injustiça social e à exploração dos mais pobres. A loucura do capitalismo leva à destruição do planeta e hipoteca a vida das futuras gerações. A loucura do capitalismo leva a um individualismo exacerbado e destrói as ligações entre as pessoas.
Mas, mais do que um sentido agudo para o diagnóstico, Emmanuel Macron realizou um espetáculo de hipocrisia desenvergonhada na tribuna da OIT. Enquanto finge as palavras de um bombeiro perante a catástrofe, Macron não pode esconder que ateou inúmeros fogos desde que está na Presidência da República.
O Presidente Macron desenvolveu uma política de alívio da carga fiscal para os contribuintes mais ricos, com a falácia que iriam investir mais no país. Mostrou um claro desprezo pelas classes populares acusando-os de recusar as mudanças e de se agarradar a regalias. A repressão foi a sua única resposta clara ao movimento dos “coletes amarelos” que se mobilizaram contra uma nova taxa sobre os combustíveis que iria prejudicar os habitantes da França periférica. Preparou a privatização da Sociedade Nacional dos Caminhos de Ferro Franceses (SNCF) e o consequente fecho de linhas ferroviárias essenciais para os territórios rurais.Este rápido sumário de dois anos de governo Macron mostra que a loucura do capitalismo está atualmente no poder em França. Devemos sim denunciar as loucuras do capitalismo e da sua atual variante neoliberal. Mas devemos sobretudo denunciar as políticas dos governantes como Emmanuel Macron que são os seus mais fiéis servidores. Não se pode esperar que um incendiário compulsivo se torne bombeiro de repente.
*Membro da Comissão Executiva da BASE-FUT e Coordenador da Região Centro