Pierre Marie*
Em Novembro de 2018 quando emergiu em França o movimento dos coletes amarelos, os meios de comunicação social portugueses focaram a sua atenção nas violências que ocorreram durante as manifestações, dando assim particular destaque aos “profissionais dos distúrbios”, para retomar uma expressão frequentemente usada pela correspondente da RTP em Paris, Rosário Salgueiro. Se as violências que aconteceram na capital francesa são condenáveis, não constituem a essência de uma mobilização que nasceu após o governo de Emmanuel Macron ter anunciado uma nova taxa sobre os combustíveis. As reivindicações desses manifestantes vestidos de amarelo eram por certo diversos mas tinham um sentido bem claro: o da justiça social.
Muitos dos que se mobilizaram nas rotundas pertenciam a uma França da periferia onde é cada vez mais difícil encontrar emprego e onde o carro constitui o único passe para ter acesso aos serviços básicos. Ainda mais no contexto de fecho de linhas de comboios e de uma possível privatização da empresa pública de caminhos de ferro. Muitos dos que vestiram um colete amarelo mobilizaram-se pela primeira vez e começaram falar de política nestas rotundas durante semanas. E exprimiram a ânsia de justiça social ao opor-se a uma taxa que iria prejudicar essa mesma França periférica.
A atual mobilização contra a reforma do sistema de aposentação tem nas suas raízes a mesma reivindicação de justiça social. Enquanto Emmanuel Macron se obstina a querer moldar um novo sistema recuando a idade de aposentação com reformas mais baixas, os sindicatos e os manifestantes pretendem salvaguardar o atual sistema assente na solidariedade. Solidariedade que está no fundamento da justiça social, como meio para alcançar uma igualdade efetiva.
As atuais mobilizações no Chile, no Líbano ou ainda na Argélia exprimem a mesma sede de justiça social contra as elites do sistema que monopolizam os recursos e o poder político. A justiça social constitui uma ferramenta para lutar contra as desigualdades que, por todo o mundo, têm vindo a crescer. O património dos mais ricos sobreviveu às recentes crises económicas e financeiras enquanto as medidas de austeridade empurraram os já mais desprotegidos para a precariedade laboral, o desemprego e a pobreza. Esse grito pela justiça social pode e deve fundamentar um projeto político alternativo assente na mobilização dos trabalhadores e de todos que não se revêem num sistema económico que pouco se importa com o bem-estar humano e a salvaguarda do planeta. Se não construirmos esta alternativa, a extrema-direita bem saberá capitalizar essa raiva para o seu projeto a procura de bodes expiatórios para a perpetuação do mesmo sistema baseado na injustiça social.
*Membro da Comissão Executiva da BASE-FUT e Coordenador da Região Centro