A revista International Journal on working Conditions publicou recentemente um interessante artigo sobre as condições de trabalho dos estivadores do porto de Lisboa, uma das classes profissionais que mais sofreram com as mudanças das relações de trabalho no quadro do neoliberalismo.Pela pertinencia das questões que levanta achamos por bem divulgar o artigo para um público mais largo.
Os autores do estudo Maria de Fátima, António Mariano e Ricardo de Lara afirmam nas considerações finais:«O trabalho é duro, cansativo e perigoso. As jornadas podem ser prolongadas em atividades que exigem concentração e atenção, e em algumas situações o uso da força física, como é o caso da peação e despeação.Quando o trabalhador refere que tem menos marcas/lesões em seu corpo,comparado com outros trabalhadores, interpretamos como uma certa naturalização do adoecimento.
O convívio diário com adoecimentos e acidentes – muitos testemunham o colega morrer ao seu lado – torna natural a exposição a fatores determinantes de adoecimento e à ocorrência de acidentes de trabalho. O adoecimento passa a ser parteda vivência no porto. Na interpretação das falas dos trabalhadores pode-se entender que,mesmo no processo de naturalização, eles consideram que a responsabilidade em promover um ambiente de trabalho, que não o exponha a fatores determinantes de agravos à saúde, é da organização do trabalho.
Enfim, os trabalhadores reconhecem que o trabalho adoece ao ponto de terem medo de morrer no trabalho. Areosa (2015, p:18)aborda essa temática ao descrever que “trabalhar em alguns setores de atividade são de facto autênticas “fábricas de risco” não controlados. Trabalhar nestes locais pode ser uma atividade altamente arriscada e perigosa”.
A análise do acidente de forma ampla, abordando todos os fatores que concorreram para o desfecho final, não se apresenta como um processo absorvido pelos detentores da organização do trabalho nas operadoras portuárias. Trata-se de compreensão do acidente segundo uma visão reducionista de que estes eventos possuem uma ou poucas causas,decorrentes, na maioria, de falha dos trabalhadores (erro humano, ato inseguro).
Para compreender o acidente é necessário compreender em que consiste o trabalho, seu conteúdo, sua variabilidade, as necessidades dos trabalhadores durante sua realização, o investimento na formação da classe dos estivadores que trabalham com cargas pesadas e suspensas, em maquinaria com grande altitude, enfim, analisar o trabalho em todos seus aspetos materiais, climáticos e organizacionais (Vilela & Almeida, 2010).
Considera-se que a presente investigação aponta para a necessidade de melhores condições de trabalho para os estivadores do porto de Lisboa. A relação entre organização do trabalho e adoecimento é conhecida pelos trabalhadores, mas ainda não provoca transformação no trabalho por estar ancorada, principalmente, na falta de investimento das operadoras portuárias na prevenção de doenças geradas pelo trabalho e ocorrência de acidentes. A atenção a esta problemática deve estar na agenda dos responsáveis pela organização do trabalho, sendo também necessário direcionar o olhar dos pesquisadores e estudos a desenvover para esta valorosa classe profissional:os estivadores do porto de Lisboa.»ver artigo completo.