Brandão Guedes*
Durante cinquenta anos de democracia os militantes da BASE-FUT também fizeram história no sindicalismo internacional.A BASE-FUT foi durante décadas a representante dos trabalhadores portugueses na Confederação Mundial do Trabalho (CMT) de inspiração cristã.Alguns anos antes do 25 de Abril de 1974 esta participação fazia-se através do Centro de Cultura Operária (CCO), em particular pelo Fernando Abreu, trabalhador da FIAT e Presidente daquele Centro e dos Movimentos Operários Católicos.
No quadro da CMT o apoio principal nos tempos da ditadura e a seguir à Revolução,chegava dos sindicatos cristãos belgas,a CSC, que teve sempre uma ligação privilegiada com a BASE-FUT e com a CGTP, em particular após a adesão desta à Confederação Europeia de Sindicatos.
Para além do Fernando Abreu outros dirigentes históricos da Base-FUT tiveram uma participação relevante na CMT logo a seguir à Revolução de 1974.Foram os sindicalistas bancários Joaquim Calhau, que no Congresso de Todos os Sindicatos integrou a Direção da CGTP-IN, e o Júlio Ribeiro do Sindicato dos Bancários do Norte .
Fernando Abreu e Joaquim Calhau tiveram a missão difícil de explicar aos sindicatos europeus e de outros continentes as razões que levaram a BASE-FUT a apoiar a unidade dos trabalhadores portugueses no seio da CGTP-IN maioritariamente comunista, embora integrando parte dos socialistas e outros sindicalistas da esquerda portuguesa.Esta situação tornou-se ainda mais complexa quando se desencadeou o processo da criação da UGT.
Embora de forma crítica a BASE-FUT defendeu que era importante para os trabalhadores manterem-se unidos numa única estrutura sindical.Mas essa unidade não deveria ser imposta pelo Estado mas deveria ser da vontade das organizações sindicais.Nos países europeus onde existem organizações sindicais de inspiração cristã pensaram alguns dirigentes que seria altura de criar uma central sindical portuguesa .A plataforma para essa organização seria naturalmente a BASE-FUT. Aos dirigentes desta coube assim a tarefa de explicar que esse não seria o caminho.Entre as razões apresentadas saliento as seguintes:
1.Existia um caminho comum de oposição ao regime fascista.Na dura luta contra a ditadura e pela democratização sindical estiveram no mesmo combate os comunistas, socialistas, cristãos e outras tendências politico-sindicais menos influentes;
2.A reflexão dos cristãos portugueses naquele momento era a de que a sua militância se deveria fazer nas organizações políticas e sindicais existentes.A ideia de criar um partido cristão ou sindicato católico não só foi repudiada,logo a seguir ao 25 de Abri, em plenários de milhares de cristãos em Lisboa e no Porto, como não tinha condições objetivas de sucesso.
3. 0s sindicalistas da BASE-FUT que estavam no terreno sabiam bem que os trabalhadores e os seus sindicatos, em particular os operários, rejeitariam qualquer tentativa de cindir a CGTP.A criação atribulada da própria UGT teve por base fundamentalmente os sindicatos históricos dos serviços onde trabalhavam sindicalistas da BASE-FUT. Nesta cisão trabalharam intensamente Mário Soares e Sá Carneiro, bem como as Fundações dos grandes partidos europeus que contribuiram com milhões de marcos e dólares.
Na generalidade as organizações sindicais europeias da área da CMT e a maioria dos dirigentes desta organização mundial compreenderam e respeitaram as opções da BASE-FUT. Os apoios que chegavam, eram, no entanto, quase simbólicos e fundamentalmente no domínio da formação e informação.A publicação pelas «edições BASE do livro da CMT «Ação sindical contra as multinacionais»é um dos exemplos desta cooperação.
Ao longo das décadas de 80 e 90 do século XX, até 2006, ano da criação da Confederação Sindical Internacional -CSI, a BASE-FUT foi membro extraordinário da CMT, participando em quase todas as reuniões da secção europeia. Participou inclusive no grande e histórico debate da criação da CSI o João Paulo,o João Lourenço. O Carlos Trindade,o Barroca o Joaquim Tavares, o Evaristo Branquinho e eu mesmo estivemos em numerosas reuniões da secção europeia da CMT. Foi a BASE -FUT que trabalhou na aproximação da CGTP à CMT e que desenvolveu uma intensa atividade para que as organizações europeias da CMT apoiassem a entrada da CGTP na CES.
Toda esta matéria ainda está pouco estudada, mas aqui ficam alguns apontamentos para o futuro.
Nota:
A Confederação Mundial do Trabalho (CMT) era um movimento sindical mundial que unia 144 organizações de trabalhadores autônomos em 116 países. A sede se encontra em Bruxelas, Bélgica, e chegou a contar com 26 milhões de membros. Os últimos anos da existência da organização se destacaram por uma afiliação de várias organizações sindicais africanas, da Europa Central e do Leste. Em 2006 fundiu-se com Confederação Internacional de Sindicatos Livres, dando origem à Confederação Sindical Internacional.
* Dirigente da BASE-FUT.
Fontes: Arquivos da BASE-FUT,
Livro dos 40 anos da BASE-FUT «Pela Dignidade do Trabalho-utopias e práticas do trabalho de base»,edições Base,2016
Foto da CGTP de um seminário conjunto com a CMT realizado em Portugal sobre as multinacionais na década de oitenta.