Jose Ricardo*
A Inflação terá como consequência que teremos de dispor de mais 9 ou 10 euros para comprar o mesmo cabaz de compras do que no ano anterior. Ou seja, a inflação vai diminuir o poder de compra dos trabalhadores. Isto percebemos.
As medidas propostas pelo Bloco de Esquerda, que podem ser consultadas em esquerda.net, são todas benéficas para os trabalhadores. Mas estas medidas destinam-se a pressionar o nosso governo, como se a inflação fosse um fenómeno em Portugal.
Para o governo a inflação é benéfica
Ora, para o Governo, a inflação é até benéfica. As classes médias que pouparam à força, porque a pandemia não as deixou frequentar os centros comerciais e a fazer viagens turísticas, vão ficar com parte das suas economias diminuídas. As classes trabalhadoras, mais desfavorecidas, em que os seus salários mal chegam para sobreviver, vão ter apoios sociais para diminuir o impacto da inflação. Por último e a melhor parte, a nossa dívida pública desvaloriza como que por magia em 9 ou 10%.
As minhas dúvidas de quase ignorante das políticas económicas é que faço perguntas simples e não encontro as respostas.
Sabemos que a inflação é um mecanismo de equilibração do sistema capitalista entre a oferta e a procura. Se a procura sobe e, portanto, os produtos escasseiam, a inflação vai obrigar a consumir menos e adequar a procura à oferta. É lógico e percebe-se. Mas a verdade é que não se viu qualquer fila nos supermercados em busca de bens que estavam em escassez. Então, se os produtos são mais do que suficientes para responder à procura, porque sobem de preço?
Dizem que os preços subiram porque houve um aumento dos custos primários, nomeadamente os custos de energia. Mas se os combustíveis estão ao preço de 2019, porque razão os produtos que aumentaram de preço não voltam ao valor de 2019?
O que tem a ver a subida de preço das couves produzidas na Lourinhã e vendidas em Lisboa com a Guerra da Ucrânia? Dizem-nos que é a inflação agregada. Como os agricultores, além do aumento de preço dos combustíveis, também sofrem a inflação em todos os produtos e serviços, têm de aumentar a sua margem de lucro.
Oportunidades de lucros
Porque razão os preços dos combustíveis subiram de imediato, com a notícia das sanções à Russia, se só se previam alterações de circuitos comerciais no final do ano? Por precaução? Isto recorda-me a lenga-lenga da comunicação social sobre as subidas de juros de capital, justificando que os mercados financeiros ficaram nervosos. Os donos do negócio dos combustíveis também ficaram nervosos e aproveitaram a oportunidade para ensacar mais uns milhares de milhões de dólares?
Voltamos às propostas do BE de um capitalismo regulado. O problema é que os governos dos Estados, já têm pouco poder. Para qualquer medida têm que seguir as normas do BCE e da Comissão Europeia, que por sua vez tem que negociar com os donos do Mercado de Capitais.
Por tudo isto sou tão crente e apoiante da proposta do nosso amigo Ivo Francisco, da necessidade de” Repensar a Economia”. Enquanto o petróleo for taxado em dólares americanos, enquanto o capital se esconder em offshores, enquanto o poder democrático não puder regular o sistema capitalista e apoiar sistemas alternativos cooperativos, não podemos esperar que a nossa vida melhor.
Volto a recordar o que diz Dowbor e a convidar-vos a perceber como o capitalismo se está a deslocar: “O mecanismo especulativo tornou-se a principal forma de acumulação de riqueza, o capital produtivo se transforma em patrimônio improdutivo. Quanto mais se aplica mais se ganha, o que gera o atual desastre de 1% das famílias mais ricas disporem de mais riqueza do que os 99% seguintes.”
Esta crise inflacionária tem pouco da adequação da oferta à procura, derivada do período de pandemia ou da guerra da Rússia, mas muito de especulação e da oportunidade de aumentar a concentração do lucro.
*Mestre em Ciências da Educação e Animador Sócio-Cultural