Um grupo alargado de Associações e sindicatos decidiram lançar uma campanha para legislar no sentido de proteger as pessoas que precisam de cuidados e os direitos dos trabalhadores cuidadores.Os autores desta iniciativa explicam a sua iniciativa.
«Como sabem, vivemos já há algum tempo uma grave crise de cuidados. Esta crise não é apenas nacional, é também internacional, e com consequências graves para as pessoas, sejam elas as que prestam cuidados ou as que necessitam dos mesmos.
A Coletiva, a Associação de Combate à Precariedade – Precários Inflexíveis, a Associação dos Profissionais do Regime de Amas, a Associação Nacional de Cuidadores Informais, a Associação para a Defesa dos Direitos dos Imigrantes e o Sindicato dos Trabalhadores da Saúde, Solidariedade e Segurança Social, decidiram juntar forças na tentativa de lançar uma campanha a nível nacional, com o objetivo de colocar o tema na discussão pública, com a narrativa que, a nosso ver, melhor responde às pessoas: por um lado o reconhecimento dos cuidados como um direito e, por outro, a garantia de direitos no trabalho para quem trabalha neste sector.
O instrumento que encontrámos para mobilizar organizações e a sociedade civil, tendo a garantia que o tema é discutido na Assembleia da República, foi a criação de uma Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC), que na prática é um Projeto de Lei, subscrito por 20 mil pessoas, que será entregue na Assembleia da República. A ILC terá como mote “Direito ao cuidado, cuidado com direitos”.
Precisamos de respostas públicas que garantam o acesso aos cuidados em todo o nosso ciclo de vida, precisamos de uma rede pública e gratuita de creches, de uma rede pública de lares, mas também de mais tempo para cuidar. Precisamos que a precariedade, os baixos salários e os abusos laborais deixem de ser a regra neste sector. Sabemos que continuar a ignorar todas estas necessidades é o mesmo que dizer que há pessoas que não têm direito a ter direitos, e sabemos também que a maior parte destas pessoas são mulheres, há tanto invisibilizadas.
Sabemos o quão urgente é mudar o paradigma dos cuidados em Portugal, e sabemos que essa mudança não é possível sem a mobilização da sociedade civil, dos movimentos sociais e do campo do trabalho.»
No preambulo do texto da Iniciativa Legislativa podemos ler: «A resposta social dos cuidados existente é assente no setor informal, na sobrecarga das famílias e numa reduzida oferta de serviços formais, cuja taxa de cobertura é das mais baixas da Europa. O acesso a serviços de cuidados depende das IPSS, tendo o Estado e as famílias como co-financiadoras.
No caso das pessoas idosas, a cobertura de cuidados formais (lares, centro de dia e apoio domiciliário) só chega a 13%. s. Em todas as outras áreas- das creches às respostas para pessoas com deficiência – falta investimento e oferta e não existem serviços públicos, nem um verdadeiro direito com plena cobertura.
A organização dos cuidados em Portugal é marcada pelo défice de oferta e de resposta e pela precariedade e desvalorização salarial das profissionais de cuidados e do serviço doméstico (em ambos os casos, cerca de 90% mulheres). A área dos cuidados é das que mais tem criado emprego, mas num modelo de exploração do trabalho precário migrante, que acentua as desigualdades sociais, inclusivamente entre mulheres.
As leis laborais também não reconhecem o direito a cuidar. Os horários, regimes de trabalho e licenças não estão adequados às necessidades, implicando que muitas pessoas, maioritariamente mulheres, tenham que realizar uma dupla jornada de trabalho ou abdicar de trabalho com rendimentos para cuidar de crianças ou de idosos.