Educação e aprendizagem em tempo de pandemia

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Júlio RIcardo*

O início do século XXI trouxe tempos conturbados para a educação e para o processo ensino-aprendizagem nas escolas. A perspetiva neoliberal capturou bastantes áreas da sociedade e a escola também conheceu a sua influência perniciosa.

De um momento para o outro, as Ciências da Educação (a Psicologia do Desenvolvimento e a Pedagogia) são consideradas um “perigo público” na educação das crianças e jovens. Os professores e educadoras de infância são socialmente desvalorizados e alvo de uma chantagem por parte de governos, como aconteceu em Portugal a partir da ação do Ministério da Educação presidido por Maria de Lurdes Rodrigues.

A autoridade e a competência do professor na estruturação do processo ensino-aprendizagem são postas em causa pelos alunos, pelos encarregados de educação e pelo próprio Ministério, que cria um sistema pérfido de avaliação docente que hierarquiza /verticaliza a classe docente: os professores são colocados a avaliar outros professores, criando subserviência, e um sistema de quotas que não permite o acesso por mérito próprio. A desvalorização social e económica da classe docente provoca um desprestígio significativo, enquanto as escolas de formação de professores formam sem as necessárias competências científicas, pedagógicas e didáticas. O nível intelectual e cultural do professor desce significativamente, e deixa de ter liberdade pedagógica para gerir o currículo e o processo ensino-aprendizagens.

Muitos professores de 25-40 anos não conhecem métodos pedagógicos que estruturem a aprendizagem da leitura e da escrita e limitam-se a seguir os manuais escolares, sem conhecimentos de didáctica da Matemática, da Língua Portuguesa ou das Ciências.

Surgem os mega-agrupamentos como estruturas burocráticas de gestão e controle e aparece o manual escolar para as disciplinas e a standardização dos conteúdos e estratégias de ensino-aprendizagem – as lições sequenciais – sendo os professores meros monitores de educação.

O individualismo e a competição instalam-se na classe docente e muitas aulas são dadas para “encher” o portefólio do professor. As escolas e todo o processo de avaliação têm por objetivo a estatística do sucesso escolar (que não o sucesso educativo!)

A escola perdeu a sua capacidade de seduzir as crianças para o trabalho de aprendizagem, criando-se uma falsa imagem de uma escola-prazer, de uma escola-ocupação. A aprendizagem deixou de ser considerada um trabalho que implica esforço, iniciativa, necessidade de perseverança e sistematização. Esta desvalorização contribuiu para um forte défice de competências das crianças e jovens, que chegam ao ciclo seguinte sem aprendizagens e capacidades essenciais.

Nos últimos anos houve um certo desanuviamento do ambiente pedagógico e humano nas escolas e os professores recuperaram alguma liberdade para gerir o processo ensino aprendizagem … mas os condicionalismos já estavam entranhados. A inovação educacional continua afastada das escolas ou então é disfarçada com o falso conceito de “escolas do futuro”, com as tecnologias de informação e comunicação como centro do processo.

Nos últimos meses, a escola sofreu um forte tsunami, que abalou os seus alicerces, e não sabemos que escola vai emergir quando retornarmos à eventual normalidade…Supostamente, muitos professores e educadores reinventaram-se como professores e animadores do processo ensino-aprendizagem, com uma criatividade pedagógica e uma liberdade de ação que se julgaria impossível de acontecer.

Será uma semente para o futuro da escola? Alvíssaras a quem for capaz de o “pré-dizer”!… 

*Júlio Ricardo- Professor do Ensino Básico, Cooperativista e Animador Social e Cultural.

 

 

 

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