José Ricardo*
Toda a Economia é social, geradora de bens e serviços para a sociedade. Mas os defensores da supremacia do lucro como bem supremo e a mercadorização do trabalho criaram para a Economia o pseudónimo de Mercado. E assim tivemos o Mercado de capitais, o Mercado de emprego, o Mercado de bens e serviços. E a este movimento denominaram neoliberalismo, roubando o nome a um movimento progressista mundial, para nos convencer que a mundialização da economia seria comparável às lutas liberais contra o absolutismo, como se a libertação do Homem fosse comparável à liberdade do Capital. Esta mistificação dos conceitos são uma narrativa para esconder as reais intenções e assim manipular as consciências das pessoas.
A Economia Social é uma resposta ao progressivo domínio da sociedade pelo capitalismo selvagem e sem ética e da impossibilidade dos Estados Europeus manter os níveis dos direitos sociais e do Estado Social, surgindo como uma solução mais económica para garantir a coesão social. Assim, a par do Estado e do Mercado, cresceu o chamado Terceiro Setor.
No caso de Portugal tem uma maior dimensão porque, como refere Sousa Santos, nunca tivemos um Estado Social mas sim um quase Estado Social. A estratégia para aproximar os níveis de desenvolvimento e apoio social aos padrões europeus, duma forma mais económica, foi delegar em organizações particulares alguns serviços, através dos acordos de cooperação e com a comparticipação das famílias. Foi assim, por exemplo, com a rede de creches e outras respostas sociais. Mas a parceria mais evidente foi aproveitar os Jardins de Infância já existentes e agrega-los na Rede Nacional de pré-Escolar, com o programa de expansão da Rede de Pré-escolar, aproximando em poucos anos o nível de cobertura ao padrão médio europeu.
Dentro da Economia Social há, de facto, uma multiplicidade de formas orgânicas das entidades e, por norma, evidenciamos os estatutos jurídicos que legitimam essas entidades para contratualizar com o Estado, sendo que a condição primeira é serem entidades sem fins lucrativos. Esta obrigatoriedade era tão evidente que os orçamentos previsionais deveriam tender para um resultado líquido igual a 0. Ultimamente tem-se assistido a uma evolução, focalizando mais a necessidade de ter excedentes para reinvestir em mais e melhores respostas sociais do que no resultado líquido nulo.
Mas uma dimensão que é menos debatida é a questão política de gestão nas organizações sociais. Está subjacente ao estatuto jurídico das entidades diferentes formas de gestão, das mais autocráticas e sem escrutínio democrático às mais democráticas e participativas, com escrutínio dos associados e dos seus trabalhadores.
O DL 172-A/2014, tenta introduzir nos Estatutos das entidades normas mais transparentes e escrutináveis: limitando o mantado do presidente da direção a quatro mandatos e impedindo familiares de ocupar órgãos de fiscalização. Mas, mesmo assim, deixou de fora entidades com estatuto jurídico especial, como se a democracia não pudesse entrar em todas as entidades.
Podemos colocar como hipótese que as formas de organização das entidades da Economia Social são influenciadas pela cultura da sociedade em geral muito marcada pelo autoritarismo do Estado Novo.
Como diz Rui Namorado “a economia social não é nominalmente referida enquanto tal na Constituição da República Portuguesa (CRP). Mas, ao lado dos setores público e privado, há um setor cooperativo e social, estando assim constitucionalmente consagrados três setores de propriedade dos meios de produção.”
As entidades da Economia Social mais democráticas estão portanto fundadas na Constituição da República e, por isso mesmo, a nossa Homenagem a António Sérgio.
*José RIcardo é Mestre em Ciências da Educação, coordenador de projectos locais de desenvolvimento, Animador Sócio-Cultural e dirigente da BASE-FUT.