José Augusto Paixão*
Comemora-se este ano (2020) o 50º aniversário da constituição da Intersindical Nacional (Outubro de 1970) que passou a designar-se “ CGTP-IN – Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses – Intersindical Nacional” no Congresso de Todos os Sindicatos, realizado em Janeiro de 1977, e que surgiu pela necessidade sentida pelos trabalhadores portugueses de se unirem e organizarem para melhor defenderem os seus interesses.
Como se iniciou a Intersindical
As dificuldades que se viviam na década de sessenta levou trabalhadores de vários sectores de atividade e de várias zonas do país a elegerem listas da sua confiança para as direções dos sindicatos corporativos, controlados pelo regime fascista, que passaram, assim, a assumir a defesa dos trabalhadores e a perceber que essa defesa só seria possível em conjunto e em coordenação com outros sindicatos. Foi então que a 1 de Outubro de 1970, quatro direções sindicais representativas de sindicatos de Lisboa, (Caixeiros, Bancários, Lanifícios e Metalúrgicos), convocaram uma primeira reunião intersindical para o dia 11 de Outubro de 1970 para discutirem alguns aspetos da vida sindical como contratação coletiva, horário de trabalho, censura e liberdade de reunião, quebrando-se assim o isolamento em que foram colocados pelo fascismo. Seguiram-se a esta, outras reuniões alargadas a mais alguns sindicatos de outras zonas do país durante um certo período que foi interrompido, em Julho de 1971, com a prisão de vários dirigentes sindicais e a proibição formal destas reuniões. Contudo a Intersindical manteve a sua atividade em semiclandestinidade, aumentando a sua influência e afirmando-se como força social e de contestação ao regime fascista, tendo sido assumidas várias medidas de solidariedade e apoio entre os sindicatos e desenvolvida a luta nos locais de trabalho, ao mesmo tempo que se inicia a montagem da estrutura de delegados sindicais em vários sindicatos. Denunciaram-se irregularidades e arbitrariedades, pressionou-se o governo no sentido de revogar a legislação lesiva dos interesses dos trabalhadores e reivindicou-se uma representação legitima dos trabalhadores na O.I.T – Organização Internacional do Trabalho, fazendo-se mobilização nesse sentido.
Como a ação da Intersindical foi aumentando significativamente, o fascismo fez cair sobre ela a repressão. A polícia começou a aparecer nos locais de reunião da Intersindical e em várias Assembleias Gerais e Reuniões de Sócios de sindicatos, impedindo a sua realização e prendendo dirigentes sindicais. A Intenção era, claramente, aniquilar completamente a Intersindical, objetivo que nunca foi alcançado pelo fascismo.
Como se organizou e desenvolveu
Os dois primeiros Congressos da Intersindical, o primeiro em Julho de 1975 e o segundo em Janeiro de 1977, foram determinantes para a sua organização e desenvolvimento.
No seguimento da mobilização e participação dos trabalhadores na vida sindical, com a eleição de delegados sindicais e de muitos trabalhadores nas direções de diversos sindicatos desde 1970, o 25 de Abril de 1974 já pôde contar com alguma organização sindical de muitos trabalhadores e de alguns sindicatos, coordenados pela Intersindical Nacional.
Foi então possível com a liberdade e a dinâmica da revolução de Abril, em cerca de 14 meses, preparar e promover o Iº Congresso da Intersindical, onde participaram cerca de 160 Sindicatos e foram aprovados os Estatutos, o Documento de Orientação e Ação para um Portugal Novo e foi eleito o Secretariado da Intersindical.
Passados 17 meses (Janeiro de 1977) realizou-se o II Congresso, agora “Congresso de todos os Sindicatos”, onde participaram cerca de 270 sindicatos, 14 Federações Sindicais, 17 Uniões Distritais e 7 Uniões Locais, abrangendo todo o país (Continente e Ilhas). Neste Congresso aberto a todos os sindicatos foram aprovados: novos Estatutos com o nome atualizado da Intersindical “ Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses – Intersindical Nacional (CGTP-IN) onde foram estabelecidos os princípios nucleares da sua organização e posicionamento na sociedade portuguesa – a unidade, a democracia, a independência, a solidariedade, o sindicalismo de massas e de classe; o Programa de Ação; o Caderno Reivindicativo; a Declaração de Princípios sobre a Lei Sindical; o Manifesto aos Trabalhadores Portugueses; e eleito o novo Secretariado. Daqui, pode-se destaca que :
“A CGTP-IN luta pela unidade orgânica do Movimento Sindical e reconhece e defende a unidade como condição necessária para a luta pelo fim da exploração do homem pelo homem, combatendo todas as ações tendentes à sua divisão. Reconhece e defende o princípio da liberdade sindical que garante a todos os trabalhadores o direito de se sindicalizarem independentemente das suas opções políticas ou religiosas. Desenvolve a sua atividade com total independência relativamente ao patronato, governo, partidos políticos, instituições religiosas, ou quaisquer agrupamentos de natureza não sindical”.
“O Congresso de todos os Sindicatos, pela sua preparação ampla, democrática e unitária, pela importância das suas conclusões e decisões, representa uma assinalável realização histórica dos trabalhadores portugueses, na defesa e alargamento da sua unidade, na valiosa confirmação do seu papel determinante em defesa das conquistas da Revolução Portuguesa, na afirmação vigorosa de que só com os trabalhadores e nunca contra eles é possível dar resposta aos mais prementes problemas nacionais”.
O Combate que lhe tem sido feito
O Congresso de todos os Sindicados, apesar das ingerências e ataques, entretanto, desenvolvidos contra o Movimento Sindical, mostrou como são fortes, poderosos e invencíveis os sentimentos unitários dos trabalhadores portugueses e como era grande a vitalidade e a maturidade do Movimento Sindical Unitário, forjado na resistência ao fascismo consolidado e ampliado com a sua ação em defesa dos interesses vitais dos trabalhadores e com a sua intervenção determinante no prosseguimento da revolução iniciada em 25 de Abril.
A grande mobilização dos trabalhadores tanto nas empresas como na sociedade em geral, a sua participação ativa nos sindicatos, agora libertos das amarras do fascismo, a decisão de eleger o maior número possível de delegados sindicais nas empresas e a sua organização em Uniões Locais, foram decisivas para o grande desenvolvimento da Intersindical Nacional, o que fez movimentar os que não queriam a unidade e defesa vital dos trabalhadores, pois sabiam que só estando divididos poderiam ser vencidos.
Foi então que a partir de alguns sindicatos de serviços que contestavam o apartidarismo e pluralismo da CGTP-IN, apareceu a chamada “Carta Aberta” apoiada por forças politicas, que de apartidárias e pluralistas nada tinham, e resolveram apostar na abertura de sindicatos paralelos e na criação da UGT, com todas as consequências para a unidade dos trabalhadores, tentando, assim, isolar a CGTP-IN.
O patronato e os governos passaram, assim, a poder contar com uma parte, ainda que pequena, de sindicatos representados pela UGT a assumir posições diferentes dos da CGTP tanto no Conselho de Concertação Social como nas Contratações Coletivas de Trabalho o que significou uma divisão dos trabalhadores e do Movimento Sindical que aproveitou muito mais ao patronato e aos desígnios dos governos que aos trabalhadores.
Foi desenvolvida, até hoje, uma pressão permanente de desvalorização do trabalho e dos trabalhadores com alteração da legislação laboral e sindical, redução salarial e dos direitos adquiridos, a invenção do trabalho precário, mal pago e sem direitos que promoveu o desemprego, que só não atingiu maiores proporções devido a não terem conseguido isolar nem inferiorizar a CGTP, que apesar das dificuldades foi sempre merecendo o apoio da maior parte dos sindicatos e dos trabalhadores, incentivando-os a lutar pela defesa dos seus legítimos interesses e desenvolvendo a sua ação na organização da vida sindical unitária.
Foi também necessário resistir aos sucessivos ataques desferidos pela política de direita contra o movimento sindical unitário, os direitos laborais e sociais e o direito do trabalho, às ingerências das várias intervenções do FMI e da Troika, que tiveram sempre como objetivo a fragilização generalizada dos direitos individuais e coletivos dos assalariados, o enfraquecimento dos sindicatos e a intromissão na sua vida interna, a limitação da autonomia coletiva, a desvalorização da contratação coletiva e a consequente desregulação das relações de trabalho.
Que Futuro
De uma vida de cinquenta anos como a que foi vivida pela CGTP-IN com responsabilidade, convicções e confiança que a galvanizou para a construção, organização e luta dos trabalhadores, só podemos confiar que a CGTP está preparada para as lutas do futuro e para continuar a desenvolver a sua atividade em prol dos trabalhadores e dos seus direitos, pelo trabalho com direitos, pela soberania nacional e pelo progresso social, na defesa permanente da Dignidade dos trabalhadores e que estes lhe continuarão a dar o seu apoio e confiança.
Pelo que vi no XI Congresso da União dos Sindicatos de Santarém, realizado em Outubro de 2019, com a dinâmica de ação e de luta demonstrados e a eleição de uma nova Direção em que 16 dos seus membros têm entre 28 e 46 anos e 10 têm entre 50 e 61 anos confirma-se a vontade de continuar a organizar e articular a atividade conjunta do Movimento sindical Unitário no Distrito de Santarém e de terem um papel determinante no reforço da luta dos trabalhadores e dos seus sindicatos, comprometendo-se com a sindicalização de 4000 trabalhadores e a eleição de 150 delegados sindicais, neste mandato.
E também pelo que pude ver na forte dinâmica e esperança no futuro que decorreram durante o XIV Congresso da CGTP-IN, realizado em Fevereiro de 2020, que se identifica, nos seus princípios e objetivos programáticos, como organização sindical de classe, comprometida desde a sua génese com as causas e as necessidades dos trabalhadores e com a defesa dos seus direitos e interesses, no quadro mais amplo dos interesses e anseios do povo português e no respeito pelos direitos, liberdades e garantias, consagrados na Constituição da República. E na grande vontade de continuar a luta, com a eleição de novos dirigentes, na sua maioria jovens e o compromisso de sindicalizarem, em todos os sindicatos, mais 120.000 trabalhadores, neste mandato, está perfeitamente confirmada a confiança que depositamos no futuro da CGTP-IN.
Perante o atual desenvolvimento da economia e as dificuldades que atravessam a atividade laboral, é preciso continuar a reafirmar que o trabalho é uma realidade essencial para a sociedade, para as famílias e para os indivíduos
*Militante e ex. Coordenador Nacional da LOC/MTC
Dirigente Sindical de 1969 a 1984