O Sindicalista Joaquim Mesquita é membro da Comissão dos Assuntos do Trabalho da BASE-FUT e trabalha numa empresa multinacional do ramo alimentar no Distrito de Aveiro.Tem larga experiência como militante social, nomeadamente nos movimentos operários católicos e mais recentemente no poder autárquico.Na CGTP, para além da Comissão Executiva, desenvolve com outros conhecidos sindicalistas desta Central uma ação significativa pelo desenvolvimento sustentável com dimensão nacional e internacional.
1.Como consegues conciliar a tua militancia de dirigente sindical na CGTP e o trabalho na tua empresa?
O trabalho na fábrica em simultânio com a actividade sindical tem aspectos positivos e negativos. Por um lado, o tempo torna-se limitado a reduzidos espaços diários, quando possível, e ao fim de semana. Uma limitação acompanhada também por alguma fadiga, natural depois de um dia de trabalho. Por outro lado, a convivência no local de trabalho com o real sofrimento e anseios, próprios e dos companheiros de trabalho, permite uma mais adequada visão sobre a exploração exercida sobre os trabalhadores, e a justeza, ou a sua ausência, do quadro legislativo e normativo na defesa da dignidade humana e dos trabalhadores em particular.
2.Como vês as recentes alterações ao Código do Trabalho?
Sobre as últimas alterações ao CT, uma das conclusões que tiro é de que a Contratação Colectiva é atacada.É restringida nas suas competências, com o que se procura retirar-lhe importância, na tantativa de transferir para a chamada “concertação social” as decisões, o quadro normativo e até o quadro legislativo das condições e relações de trabalho. Ora, esta “concertação social” é em si mesma um espaço desiquilibrado em favor do patronato, onde a CGTP-IN tem participado apresentando as suas propostas, numa luta que pretende melhorar as condições de trabalho ou, pelo menos, procurando impedir que elas se agravem – uma luta que tem estendido aos locais de trabalho e à rua… Quanto a firmar acordos, sim, desde que signifiquem o respeito pela dignidade humana e melhoria das condições de vida dos trabalhadores. O contrário seria cumplicidade.
Porque esta concertação tem resultado no agravamento das condições de trabalho e de vida dos portugueses, em coerência com a ideologia dominante da direita, numa deriva controlada por este governo e pelas decisões de cariz liberal tomadas na Assembbleia da República.
Assim, mantém-se a norma da caducidade; alarga-se o período experimental para 180 dias a pretexto do combate à precariedade;agravam-se as condições da aplicação do banco de horas grupal; trava-se a recuperação da remuneração através do trabalho…
Como trabalhador, operário fabril, e como cidadão com familiares e amigos que estão ou estarão no mercado de trabalho, vejo que estas alterações ao CT significam um agravamento da exploração sobre os trabalhadores e também mais espaço de arbitrariedade para o patronato.
Não é portanto de estranhar que os portugueses, e referindo as gerações mais jovens, continuem a sentir a falta de estabilidade e o sentimento de desesperança,. Sentimento que a quebra demográfica bem manifestam tanto na baixa natalidade como na emigração.
3.Como militante cristão como vês a relação entre fé cristã e a intervenção sindical?
A luta contra as desigualdades, resultem elas de mecanismos da exploração dos trabalhadores ou introduzidos por ideologias político-económicas de um verdadeiro casino global, constiuem um dos objectivos mais importantes da actividade sindical. Condições de vida dignas estarão sempre ligadas ao princípio cristão da Universalidade, também defendido pelo sindicalismo. Não podemos aceitar que os princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, como a saúde ou o ensino, sejam substituídos por privilégios garantidos pela capacidade financeira individual. Quem defenda estes privilégios e se afirme cristão. é incoerente e manifesta um contra-testemunho.
Como militante cristão (sacerdote, profeta e rei – tarefas que me delegaram no dia do meu baptismo, e que procuro exercer) encontro na intervenção sindical a forma socialmente mais eficaz de promover a Justiça. O exercício do trabalho foi pervertido em exploração, em condições de tortura e escravatura, funcionando numa teia a que chamam mercado de trabalho. Cabe ao sindicalismo a tarefa de reconduzir as relações de trabalho ao nível do respeito pela dignidade humana, que passa pela realização pessoal, pela promoção da dignidade de cada ser humano enquanto trabalhador e pela construção de uma sociedade harmoniosa.