Economia social não é devidamente considerada no Plano de Recuperação e Resilência-diz Confederação das Colectividades de Cultura

«A estrutura apresentada deixa bem claras as opções do Governo, assentes essencialmente em investimento público e apoio às empresas. No que respeita à Economia Social, designada na Constituição da República Portuguesa, como Economia Cooperativa e Social e tipificada na Lei de Bases da Economia Social aprovada por unanimidade na AR, não há qualquer referência como possível participante/contribuinte para a implementação do PRR. É uma falha grave.»-eis uma das críticas que a Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto faz ao Plano de Recuperação e Resilência (PRR) colocado  á discussão pública pelo governo.

Aquela Organização acrescenta ainda a dado passo:«Não temos qualquer objeção quanto às prioridades estratégicas, reconhecendo ser necessário e urgente reformar e robustecer o sector público nas várias áreas previstas no PRR e apoiar o tecido produtivo nacional de forma a dignificar o trabalho, melhorar as condições e a empregabilidade por serem factores essenciais para a produtividade e a criação de mais valias, devendo ser redefinida e mais justa, a distribuição da riqueza produzida».

Pelo seu interesse global para o mundo associativo publicamos na integra e com o devido relevo a Posição Oficial daquela Confederação:

«Num documento de 143 páginas, foi-nos apresentado a sintese do PRR – Programa de Recuperação e Resiliência. Este documento estruturante da nossa vida colectiva nacional, está em discussão pública, sendo por isso chamada à sua apreciação, entre outras, entidades como o CES e o CNES, órgãos de aconselhamento do Governo onde a CPCCRD – Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura e Recreio tem assento.

Este documento a enviar brevemente à Comissão Europeia, é a versão quase final, de vários documentos estratégicos que têm vindo a ser apresentados e discutidos nos últimos meses. Entre eles, está a Estratégia Portugal 2030, já aprovado pelo Governo em 2017 ou “Visão Estratégica para o plano de recuperação económica de Portugal 2020-2030” do Professor António da Costa e Silva.

Estes documentos estratégicos, implementados através dos Orçamentos de Estado anualmente discutidos e aprovados pela Assembleia da República, decorrem da nossa condição de país membro da União Europeia e do encerramento de um ciclo designado Portugal 2020 e perspectiva de um novo ciclo Portugal 2030. Nele deverão constar as grandes medidas económicas e sociais para o período 2021/2029, ora agravadas com a pandemia, sendo por isso de vital importância política.

Cabe ao Governo, identificar as necessidades, auscultar as entidades que possam contribuir para o diagnóstico e implementação, preparar a proposta sujeita a regras comunitárias, decidir e executar. Cada coisa a seu tempo, até ao momento em que se implementa o PRR e se esperam e medem resultados e impactos. Os valores previsivelmente envolvidos são extraordinários quer pelo volume de financiamentos externos, complementados com investimento nacional, quer pelas mudanças estruturais que poderão produzir.

Ao analisarmos o PRR, a executar em três períodos 2021-2023; 2023-2026; 2026-2029, constata-se que existem três dimensões estruturantes: Resiliência; Transição climática e Transição digital. No total destas dimensões, estão previstas 19 Componentes com 36 Reformas e 77 Investimentos. Os valores financeiros envolvidos ascendem a cerca de 50 mil milhões de euros a fundo perdido, podendo aceder a mais 14,2 mil milhões de euros em empréstimos.

A estrutura do PRR, compromissos e falhas

A estrutura apresentada deixa bem claras as opções do Governo, assentes essencialmente em investimento público e apoio às empresas. No que respeita à Economia Social, designada na Constituição da República Portuguesa, como Economia Cooperativa e Social e tipificada na Lei de Bases da Economia Social aprovada por unanimidade na AR, não há qualquer referência como possível participante/contribuinte para a implementação do PRR. É uma falha grave.

Não temos qualquer objeção quanto às prioridades estratégicas, reconhecendo ser necessário e urgente reformar e robustecer o sector público nas várias áreas previstas no PRR e apoiar o tecido produtivo nacional de forma a dignificar o trabalho, melhorar as condições e a empregabilidade por serem factores essenciais para a produtividade e a criação de mais valias, devendo ser redefinida e mais justa, a distribuição da riqueza produzida.

A Economia Social, como também é conhecida, enquadra mais de 60.000 entidades das quais 33.000 são Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto. Tem um papel essencial na proximidade às populações, prestação de serviços complementares ou em substituição do Estado, participação cívica, contribuindo de forma decisiva para a qualidade da democracia e da vida das nossas populações. Estima-se que cerca de 3 milhões de portugueses tenham actividade associativa regular.

Estes aspectos, para além do reconhecimento do Senhor Presidente da República, foram reconhecidos pela Senhora Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social em vários momentos, destacando-se a apresentação pelo Senhor Primeiro Ministro, da Visão Estratégica do Professor António Costa e Silva na Fundação Calouste Gulbenkian no final do ano passado, onde tivemos oportunidade de contribuir para o diagnóstico e recomendar um conjunto de aspectos com vista ao PRR agora apresentado. Pelos vistos, não terá servido de grande coisa uma vez que o PRR ignora completamente este sector.

Poderão dizer que a Economia Social está considerada na Dimensão Resiliência, Componente C3 – Respostas Sociais, no valor de 583 milhões de euros (pág.5). Quando analisamos em pormenor os quadros e páginas seguintes, onde se abordam as Reformas e os Investimentos (pág.7) constatamos que estes valores se destinam a áreas de apoio social tendencialmente afectas ao modelo assistencialista que responde, e bem, às situações sociais agudas. O modelo social que se deseja deverá assentar na componente preventiva e ser complementado com a componente remediativa. Este PRR poderá contribuir decisivamente para esta mudança.

A ausência da Economia Social neste PRR, é contraditória com algumas expressões que se vão encontrando ao longo do documento: “O PRR deve ser o Plano de todos os Portugueses” (pág.2); “As pessoas primeiro” (pág. 14); “… consolidação de uma sociedade digna que ninguém fique para trás” (pág.18); “Coesão social e territorial” (pág. 22), ”Dinamizar a inclusão através do desporto, cultura e lazer” (pág. 51). Se algumas destas expressões não tiverem medidas concretas, objectivos, valores, públicos alvos e executores definidos, deixarão a ideia de estarmos perante markting político. O que é facto, é que nem na letra nem no espírito deste documento, é revelada a intenção política do Governo face à Economia Social em geral e ao Associativismo Popular de Cultura, Recreio e Desporto em particular.

Como forma de confirmar o que atrás se afirma, desafia-se o Governo a esclarecer quais as percentagens atribuídas a cada um dos 3 sectores da economia, tal como previsto na Constituição da República Portuguesa: sector público, sector privado e sector cooperativo e social.

Áreas e potencialidades da Economia Social

O contributo do Movimento Associativo Popular

A sociedade em geral reconhece a importância da Economia Social. Os decisores políticos de uma forma geral também reconhecem e chegam a referir-se a esta como sendo essencial na vida das populações e do país. Naturalmente que os discursos não são todos iguais porque, nem as pessoas nem os decisores políticos são todos iguais. Ainda assim, importa registar um amplo consenso ou mesmo unanimidade em torno da Economia Social e do Movimento Associativo Popular – MAP.

O MAP conta com cerca de 425.000 Dirigentes associativos, voluntários, benévolos e eleitos. A situação de pandemia tem afectado de forma profunda e dramática estes homens e mulheres que vendo encerradas as suas Colectividades, suspensas as actividades e com o risco real de muitas delas já não retomarem o funcionamento, vivem momentos de ansiedade, angústia e incerteza. É a inclusão social preventiva, a economia local, regional e nacional, são valores e principios, é saúde mental comunitária, é a identidade e a interculturalidade que estão em causa.

A capacidade de resiliência e resistência dos Dirigentes a esta crise, já demostrada em muitas outras situações, não está em causa, mas precisa urgentemente de ter sinais de apoio e de reconhecimento por parte dos poderes públicos, pela sua dedicação e pelo valor social do seu trabalho. O PRR é a mola real que pode impulsionar a retoma deste sector no curto prazo (2021-2023), no médio prazo (2023-2026); longo prazo (2026-2029). Não considerar esta possibilidade seria irresponsabilidade, falta de sensibilidade e falta de inteligência.

Poderá haver quem se sinta confortável com as brevissimas e episódicas referências à Economia Social. Quanto a nós, consideramos que a transparência é essencial. É um dos valores do MAP. Por isso entendemos que as medidas, a existirem, terão que ser concretas e expressas no documento porque, se forem difusas, poderão nunca ser executadas e ninguém será responsabilizado. Os efeitos desejados junto das populações não existirão e os fundos disponíveis, poderão mesmo não ser utilizados e assim se perder mais uma oportunidade.

Nesse sentido, com a responsabilidade de quem pretende de forma crítica, séria, realista e construtiva, contribuir para um Portugal em que ninguém fique para trás e que tenhamos um PRR para todos os Portugueses, manifestamos a nossa disponibilidade para apoiar e trabalhar para a sua implementação, partindo do principio que serão consideradas as seguintes recomendações:

1.Resiliência – Provisão de equipamentos e respostas sociais (pág.7)

Investimentos:

– Apoio à regularização, manutenção e construção de instalações associativas;

– Apoio à implementação de medidas de auto protecção contra incêndios;

– Apoio à adaptação de acessos e circulação a pessoas com deficiência;

  1. Agenda temática 1 – As pessoas primeiro: um melhor equilibrio demográfico,

maior inclusão, menos desigualdade. (pág.13)

– Inclusão preventiva através de apoio às actividades associativas em territórios de baixa densidade (interior) ou em risco de exclusão (urbanos);

– Apoio a programas promotores de intergeracionalidade associativa apoiado no modelo tecnológico;

  1. Inovação, digitalização e qualificação como motores do desenvolvimento

Qualificação das instituições (pág.14)

– Capacitação das instituições e Dirigentes – Federações e Confederações;

– Digitalização dos acervos documentais das instituições;

– Modernização administrativa e equipamentos informáticos;

  1. Transição Digital (pág.15)

– Formação de 30.000 Dirigentes em competências digitais (acessos e online);

– Aquisição de 20.000 computadores;

– Criação de 10.000 contas e sítios na internet;

  1. Plano que integra a perspectiva de género (pág.33)

– Discriminação positiva das Mulheres Dirigentes Associativas, no acesso às creches e

Escolas dos filhos, emprego e serviços públicos;

  1. Componente Habitação (pág.44/48)

– Cedência gratuita ou aluguer de instalações do Estado para fins associativos às Colectividades com Estatuto de Utilidade Pública a custos simbólicos;

  1. Respostas Sociais (pág.49/53)

– Reconhecimento do papel do MAP para a prevenção da solidão, o envelhecimento activo e aumento da esperança média de vida;

– Considerar as Colectividades com apoio a idosos como EAPI – Estruturas Associativas para Pessoas Idosas;

– Criação de 308 equipas multidisciplinares de apoio gerontológico aos associativistas idosos;

– Criação de 308 equipas especializadas para a promoção do desporto e lazer para pessoas com deficiência (inclusão social preventiva);

– Integração temporária de 20.000 Jovens Estagiários;

– Regularização e criação de 30.000 empregos nas colectividades;

– Apoio às diferentes áreas da cultura popular e tradicional pelo Ministério da Cultura;

– Apoio ao recreio e desporto associativo popular amador pelo IPDJ;

  1. Operações integradas em comunidades desfavorecidas nas Áreas metropolitanas de Lisboa e Porto (pág. 58)

– Combate à pobreza e exclusão social através de inserção social preventiva;

– Acesso à cultura, criatividade e valorização da interculturalidade;

  1. Incentivo Adultos (pág.72)

– Aprendizagem ao longo da vida – literacia cívica em todos os graus de ensino;

– Formação/acção para 10.000 adultos em Dinamização e Gestão Associativa;

  1. Eficiência energética em edifícios associativos (pág.108)

– Apoio à remodelação das redes de energia e poupança energética;

– Apoio à produção de energias alternativas (limpas);

  1. Governação e Implementação (pág. 140)

– Disponibilidade para colaborar com a Comissão Nacional de Acompanhamento;

– Criação de uma ferramenta “Perguntas Vs Respostas” no previsto Portal de Transparência;

– Previsão de momentos de avaliação intercalar da execução fisica e financeira do PRR;

Por fim:

Torna-se cada vez mais pertinente avaliar o peso do MAP no PIB e no VAB da Economia Social e do país. Precisamos saber com rigor científico, quantos postos de trabalho directos e indiretos promovemos, qual o valor económico e as movimentações financeiras.

Sem prejuizo de um maior aprofundamento por entidades externas ao associativismo popular, estamos certos que o MAP é um contribuinte líquido do Orçamento de Estado. Cada euro investido no MAP tem forte impacto positivo nos planos social, económico, financeiro, sustentabilidade da segurança social e impostos.

A Confederação Portuguesa das Colectividaes de Cultura, Recreio e Desporto está dísponivel para desenvolver e orçamentar cada uma das propostas com as entidades responsáveis pelo PRR.

O Associativismo é um dos pilares da sociedade!

As Colectividades são pilares do Associativismo!

As Colectividades fazem falta a Portugal!»

 

Lisboa, 22 Fevereiro 2021                                      A Direcção

 

Junta-te à BASE-FUT!